#14. A Evolução do SaaS Vertical
Por que as inovações tecnológicas a partir da IA podem fazer ruir velhas barreiras ao crescimento do VSaaS?
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Resumo de 1 minuto
1️⃣ Tamanho de Mercado não é mais um impeditivo: Modelos de precificação como Usage-Based Pricing e Outcome-Based Pricing aumentam o potencial de receita dos VSaaS, tornando mercados antes considerados pequenos muito mais atraentes.
2️⃣ Movimentos GTM mais eficientes: A IA permite que Softwares Verticais escalem com modelos de vendas Low Touch e automatizem processos, reduzindo o custo de aquisição e melhorando a retenção.
3️⃣ As três ondas do SaaS Vertical: De Cloud para Fintech e agora IA, o VSaaS evoluiu para oferecer não apenas software, mas serviços financeiros e inteligência artificial, aumentando sua relevância para os clientes.
4️⃣ Concorrência com Softwares Horizontais: O SaaS Vertical está conquistando espaço ao oferecer soluções especializadas que atendem a necessidades que Softwares Horizontais não conseguem suprir.
5️⃣ M&As e desafios de integração: Empresas SaaS horizontais podem adquirir startups verticais para entrar em nichos específicos, mas a integração entre modelos distintos traz desafios e riscos estratégicos.
“A essência da estratégia é escolher o que não fazer.” Michael Porter
Introdução
Durante boa parte da Era do Software Cloud, o Software Vertical enfrentou diversas barreiras que dificultaram sua adoção em larga escala no modelo SaaS. Esses desafios foram tão significativos que, por um tempo, o modelo foi encarado com certo ceticismo pelo Venture Capital. Pelo menos três barreiras principais podem ser destacadas:
Tamanhos de Mercado: A percepção de que os mercados verticais eram pequenos demais para justificar investimentos em escala.
Limitação de Movimentos GTM: A dificuldade em implementar estratégias de Go-To-Market eficientes e escaláveis.
Concorrência com Softwares Horizontais: A competição com soluções horizontais, que já dominavam o mercado Cloud.
A principal diferença entre o Software Vertical e o Software Horizontal está no escopo de suas soluções. Enquanto o primeiro é projetado para atender setores específicos (como saúde, contabilidade ou direito), o segundo oferece funcionalidades amplas, aplicáveis a múltiplos setores simultaneamente.
Nesta edição da FinanSaaS, analisamos essas barreiras históricas e como a Era da IA está transformando o cenário para o Software Vertical. Com o avanço da inteligência artificial, novas possibilidades estão surgindo, redefinindo o potencial do VSaaS e abrindo caminho para um futuro em que especialização e personalização se consolidam como vantagens competitivas.
#1. Tamanhos de Mercado
O TAM (Total Addressable Market) é um conceito fundamental para avaliar o potencial de crescimento de um produto ou serviço. Ele representa a receita total que poderia ser gerada se a solução capturasse 100% do mercado, oferecendo uma visão clara do tamanho da oportunidade disponível. No entanto, um dos principais desafios históricos do SaaS Vertical (VSaaS) era a percepção de que os mercados verticais eram pequenos demais para justificar investimentos em larga escala.
Essa limitação estava, em parte, associada ao modelo de precificação tradicional do SaaS, baseado em número de usuários. Nesse modelo, os clientes pagam uma taxa recorrente (mensal ou anual) pelo acesso ao software, sem relação direta com o volume de uso. Como consequência, o valor percebido estava essencialmente atrelado à capacidade do software de aumentar a produtividade humana, otimizando fluxos de trabalho e liberando tempo para atividades estratégicas.
Esse paradigma, no entanto, impunha uma barreira significativa ao VSaaS. Em mercados verticais, onde o número de usuários potenciais é menor, o modelo de precificação por assinatura limitava tanto a escalabilidade quanto a viabilidade econômica. A inteligência artificial está transformando essa equação.
Com a IA, novos players verticais podem desenvolver produtos e serviços que não apenas aumentam a produtividade das empresas, mas também automatizam tarefas que antes exigiam especialistas humanos com anos de experiência. A introdução de agentes de IA autônomos pode permitir que os VSaaS capturem uma fatia maior da cadeia de valor de seus clientes, ampliando seu escopo de atuação e potencializando o impacto gerado.
Essa mudança na percepção de valor abre espaço para novas estratégicas de precificação, como Usage-Based Pricing (precificação baseada no uso) e Outcome-Based Pricing (precificação baseada em resultados), além de modelos híbridos. Essas abordagens são mais aderentes às novas possibilidades dos mercados verticais e oferecem oportunidades para incremento de receita sem exigir grandes investimentos adicionais em P&D ou estratégias de GTM.
Ao romper a barreira da precificação tradicional do SaaS, é redefinido os limites de TAM no VSaaS. O que antes era visto como um mercado restrito agora se expande significativamente, permitindo que os SaaS verticais escalem em três frentes principais:
Mercados mal atendidos ou negligenciados.
Mercados emergentes e em rápido crescimento.
Mercados com incumbentes lentos para se adaptar às mudanças.
Com soluções altamente personalizadas e adaptadas às necessidades específicas de cada setor, o VSaaS pode agora aumentar o LTV (Lifetime Value) por cliente e reduzir o CAC (Customer Acquisition Cost) com novas estratégias antes consideradas inviáveis, avançando em diversos setores como Direito, Govtech, Healthtech, Educação, entre outros.
Nos próximos anos, veremos cada vez mais cases de sucesso no SaaS Vertical, não apenas atingindo TAMs maiores, mas também conquistando market share relevante em seus nichos. Em alguns casos, poderemos até observar cenários de “Winner-Take-Most” (ou “o vencedor leva a maior parte”), onde a solução vertical que melhor atende às necessidades de um setor se torna dominante.
Essas transformações não só impactam a entrega e o valor das soluções, mas redefinem as estratégias de GTM, antes vistas também como um obstáculo ao crescimento do VSaaS.
#2. Limitação de Movimentos GTM
O avanço da IA no SaaS Vertical não impacta apenas o produto e a tecnologia, mas também redefine as estratégias de Go-To-Market. A combinação entre Software Vertical, Cloud e IA abre caminho para abordagens mais consistentes e escaláveis de entrada no mercado, alterando como essas soluções são distribuídas, adotadas e retidas pelos clientes.
Assim como a era Pré-Cloud trouxe (e ainda traz) aprendizados valiosos para os negócios em nuvem, o mercado consolidado no Cloud agora serve como base estrutural para as próximas Eras do SaaS e das novas ondas de inovação. A incorporação de IA no VSaaS viabiliza movimentos GTM mais eficientes e sustentáveis, otimizando o custo de aquisição de clientes (CAC) e melhorando a retenção.
Por exemplo, as variações de movimentos GTM, que vão do Low Touch (baixo envolvimento humano) ao High Touch (alto envolvimento humano), passam a contar com novas possibilidades de aplicação no VSaaS.
No modelo Low Touch, a IA pode automatizar processos de onboarding, suporte ao cliente e vendas autoguiadas, reduzindo ainda mais os custos operacionais e permitindo maior escalabilidade em clientes PME.
No modelo High Touch, a IA pode melhorar a experiência do cliente por meio de insights personalizados, recomendações estratégicas e suporte preditivo, aumentando o valor percebido e a fidelização, o que amplia as possibilidades do VSaaS no mercado Enterprise.
Essa flexibilidade nos modelos GTM, combinada com estratégias de precificação mais alinhadas ao mercado, permite que os VSaaS alcancem um ROI positivo mais rapidamente, tornando a implementação do modelo de receita recorrente financeiramente viável mesmo em mercados mais nichados.
As aplicações de IA não apenas removem barreiras históricas ao crescimento do VSaaS, mas também redefinem as regras do jogo da concorrência no Cloud. Com movimentos GTM mais eficientes, soluções altamente especializadas e a capacidade de navegar em ambientes regulatórios complexos, o SaaS Vertical pode conquistar mercados antes considerados improváveis.
#3. As Três Ondas do SaaS Vertical
Os softwares verticais dependem de grandes bases de dados especializadas, que servem como um diferencial competitivo essencial. No entanto, essa dependência também representava uma barreira significativa para a migração para o modelo Cloud, dificultando a escalabilidade e a viabilidade econômica. Com a evolução dos Large Language Models (LLMs), esse cenário tem grande potencial de mudança.
A capacidade dos LLMs de analisar e processar dados não estruturados é amplamente reconhecida, mas outro forte diferencial para os softwares verticais está na gestão de dados com maior especificidade e segurança. Modelos de IA treinados exclusivamente para um nicho específico podem se aprofundar cada vez mais nas particularidades do setor, entregando soluções mais precisas para os clientes. Essa profundidade em segmentos específicos é algo que os softwares horizontais dificilmente conseguem replicar, dada a generalização necessária para atender a múltiplos setores.
Essa vantagem se estende a outra barreira também crítica aos VSaaS, da complexidade dos ambientes regulatórios. Setores como saúde, por exemplo, são altamente regulamentados, com requisitos rigorosos de conformidade e segurança, o que acaba por aumentar os custos de investimentos no software para atender tais obrigações.
A IA aplicada de forma verticalizada pode resolver esse problema, permitindo que os VSaaS automatizem a conformidade regulatória, otimizem processos e reduzam riscos. Modelos treinados por equipes especializadas nesses setores podem empilhar conhecimento específico, criando Economic Moats que dificultam a entrada de softwares horizontais menos especializados.
Segundo a Andreessen Horowitz, o crescimento do VSaaS pode ser dividido em três ondas evolutivas:
VSaaS Cloud: A primeira onda trouxe a migração de serviços tradicionais para a nuvem. Essa fase eliminou barreiras físicas e otimizou a experiência do usuário, criando a base para a escalabilidade do SaaS Vertical.
VSaaS Fintech (Cloud + Fintech): A segunda onda integrou soluções financeiras diretamente nas plataformas. Essa camada financeira gerou novas fontes de receita e fidelização, ao resolver problemas críticos de negócios de forma integrada.
VSaaS IA Inside (Cloud + Fintech + IA): Na atual terceira onda, a inteligência artificial está transformando a forma como o trabalho é executado. Enquanto as duas primeiras ondas focaram em digitalizar e integrar processos, a IA avança para automatizar e aprimorar tarefas que antes dependiam exclusivamente de intervenção humana. Em setores como fitness e beleza, por exemplo, operações como marketing, vendas, atendimento ao cliente e gestão financeira podem ser ampliadas ou até totalmente assumidas por sistemas inteligentes.
Com estratégias de GTM bem estruturadas e maior tração de mercado por meio da especialização vertical, novas empresas VSaaS não apenas migrarão para o Cloud de forma eficiente, mas também pularão etapas ao embarcar diretamente na era do Cloud + IA.
Isso as colocará em uma posição de vantagem competitiva, permitindo que enfrentem softwares horizontais com muito mais poder de fogo e capacidade de captura de valor dentro de suas verticais.
A terceira onda do VSaaS redefine o papel do software vertical na era da IA. Ao integrar inteligência artificial, as plataformas VSaaS não apenas automatizam processos, mas também criam novas oportunidades de inovação, personalização e escalabilidade, preparando os negócios para um futuro onde o trabalho será, cada vez mais, software.
#4. Concorrência com Softwares Horizontais
O SaaS Horizontal é projetado para atender a múltiplos setores e empresas, o que exige que suas funcionalidades sejam genéricas o suficiente para abranger uma ampla gama de casos de uso. No entanto, essa generalização pode se tornar um gargalo: sempre que há necessidade de uma personalização mais profunda, a adaptação torna-se complexa e custosa, pois a solução não foi originalmente construída para atender às particularidades de um único setor.
Já o SaaS Vertical é desenvolvido desde a sua concepção para atender segmentos específicos, incorporando funcionalidades e fluxos de trabalho altamente alinhados às necessidades daquele nicho. Essa especialização intrínseca possibilita um nível de personalização muito mais profundo, o que se traduz em uma entrega de valor mais eficiente e uma melhor aderência ao dia a dia dos clientes.
Enquanto a personalização é um gargalo para o SaaS Horizontal, no SaaS Vertical ela se torna uma força motriz. Essa diferença estrutural coloca o VSaaS em uma posição única para avançar sobre mercados nichados, enquanto os Softwares Horizontais precisarão encontrar novas formas de manter suas fatias de mercado e competir com soluções altamente especializadas.
Para empresas horizontais já estabelecidas no Cloud, a IA também cria oportunidades de aprofundamento na especialização e na entrega de valor para os clientes. No entanto, conforme o SaaS Vertical expande seu alcance sobre diferentes setores, ganhando diferenciação no produto, distribuição especializada e consolidando um product-market fit robusto, torna-se progressivamente mais difícil para os Softwares Horizontais ocuparem espaço verticalmente dentro das cadeias de valor de suas respectivas indústrias.
Uma das respostas estratégicas para alguns players horizontais, dependendo de sua velocidade de adaptação à verticalização, será recorrer a M&As de startups especializadas em verticais dentro de seus respectivos segmentos. No entanto, essa abordagem carrega desafios importantes. A integração de um modelo de software tradicionalmente horizontal com um modelo verticalizado pode gerar um negócio “em 45°”, com inclinação para cima ou para baixo, a depender da qualidade da execução da fusão.
Se bem estruturada, essa fusão pode combinar escala e distribuição horizontal com profundidade e especialização vertical, criando um diferencial competitivo significativo. No entanto, falhas na integração podem gerar desalinhamento entre produto, cultura e equipes GTM, tornando a operação menos eficiente e, em casos extremos, destruindo valor ao invés de gerá-lo.
O desafio central não é simplesmente adquirir startups verticais, mas sim conduzir essa transição de forma estratégica, garantindo que a especialização setorial da empresa adquirida seja preservada e amplificada, enquanto a estrutura horizontal traz a vantagem de escala e alcance. Essa execução não é trivial e, se mal conduzida, pode resultar em uma proposta de valor desalinhada e incapaz de competir com players que nasceram verticais e continuam evoluindo dessa forma.
Conclusão
O SaaS Vertical, por anos, foi considerado um modelo de crescimento limitado, com barreiras significativas em termos de TAM, distribuição e concorrência com players horizontais consolidados. No entanto, a ascensão da inteligência artificial alterou profundamente essa dinâmica. Com novas abordagens de precificação, estratégias de GTM mais escaláveis e diferenciação competitiva através da especialização, os VSaaS estão agora melhor posicionados do que nunca para capturar valor em seus respectivos nichos.
A evolução das três ondas do SaaS Vertical demonstra que a especialização não é mais um fator limitante, mas sim um motor de crescimento. A integração da IA ao modelo Cloud não apenas acelera a entrega de valor, mas também permite que soluções verticais se tornem cada vez mais indispensáveis para seus mercados. O avanço da personalização e da automação cria barreiras competitivas difíceis de serem replicadas pelos Softwares Horizontais, consolidando a posição dos VSaaS dentro de setores altamente regulamentados e de alta complexidade operacional.
A competição entre modelos horizontais e verticais também está evoluindo. Empresas SaaS horizontais podem optar por adquirir startups verticais para se especializar, mas essa estratégia não é isenta de desafios. O sucesso dependerá de quão bem essas integrações forem executadas, garantindo que a profundidade vertical seja preservada sem comprometer a eficiência e a escala da distribuição horizontal.
Obrigado por acompanhar até aqui e até a próxima edição!
Referências
Ten lessons from a decade of vertical software investing - Bessemer Venture Partners
The future of AI is vertical - Scale Venture Partners
The Verticalization of Everything - NFX
Vertical SaaS: Now with AI Inside - Andreessen Horowitz